Várias vozes se levantam contra a exploração de caulino na Figueira da Foz, Cantanhede e Soure

Pedidos de exploração de caulino nos concelhos de Figueira da Foz, Soure, Pombal e Cantanhede têm mobilizado a população, organizações sociais e políticos, todos contrários à atividade que pode trazer impactos ambientais e comprometer a qualidade de vida na região.

 

O caulino tem vários usos industriais, nomeadamente como matéria-prima das indústrias cerâmica e cimenteira e no fabrico de medicamentos, papel, plásticos e tintas. Porém, sua exploração tem impactos ambientais significativos entre os quais a Quercus aponta: alterações topográficas irreversíveis; produção de poeiras, gases, vibrações e resíduos industriais; afetação da rede hidrográfica superficial e subterrânea, com alteração de cursos de água, destruição e esgotamento de nascentes e rebaixamento drástico da superfície freática; diminuição da qualidade visual e do valor cultural da paisagem; aumento da insegurança, pela criação de amplas crateras e circulação de maquinaria e transportes pesados (QUERCUS, 2014).

 

Em Figueira da Foz, o pedido de concessão para exploração de caulino numa área de 500 hectares no norte do concelho foi feito pela empresa Motamineral à Direção Geral de Energia e Geologia (DGEG), em 2014. Os depósitos minerais estão localizados numa área denominada Pocinho, em terrenos que abrangem as freguesias de Bom Sucesso e Ferreira-a-Nova. A região, que tem uma vasta área florestal, está próxima de cursos de água e lagoas, e concentra produção agrícola que sustenta várias famílias (TRINDADE, 2014).

 

Numa tentativa de impedir o licenciamento da exploração mineral, os moradores se uniram e lançaram o movimento "Pela Vida, Contra o Caulino", criaram uma página na rede social Facebook para manifestar discordância com a exploração, e compareceram em massa às sessões públicas de esclarecimento realizadas nas freguesias de Bom Sucesso e Ferreira-a-Nova, quando se manifestaram, verbalmente e por escrito, contrários a qualquer possibilidade de exploração de caulinos na zona de Pocinho (AGÊNCIA LUSA, 2014; VAZ, 2014).

 

Os partidos e coligações das câmaras municipais, assembleias municipais, juntas de freguesia e deputados da Figueira da Foz, Cantanhede, Mira e Coimbra também se uniram ao protesto dos moradores (O PALHETA NA FOZ, 2014; OUTRA MARGEM, 2014). O líder da distrital de Coimbra do PS, Pedro Coimbra, escreveu uma carta aberta aos ministros do Ambiente e da Economia, convidando-os a visitar os concelhos de Figueira da Foz, Cantanhede, Soure e Mira, ameaçados por explorações de caulinos. Ele argumentava que a exploração mineira de caulino a céu aberto, “contraria, tal como está provado e fundamentado, os princípios mais básicos do equilíbrio social, da sustentabilidade ambiental e do desenvolvimento humano” (DIÁRIO DE COIMBRA, 2014).

 

Em Figueira da Foz, a Assembleia Municipal aprovou, por maioria, em fevereiro de 2014, uma moção contra a exploração de caulino em duas freguesias do município. Intitulada "Pela População, Não ao Caulino", a proposta foi apresentada pelo deputado do Partido Socialista (PS) Miguel Pereira e acolhida pelas bancadas do movimento Somos Figueira (PSD/CDS-PP/MPT/PPM), Coligação Democrática Unitária (CDU) e Bloco de Esquerda (AGÊNCIA LUSA, 2014).

 

Além disso, o executivo da Câmara Municipal do concelho enviou um ofício à Direção de Serviços de Minas e Pedreiras da Direção-Geral de Energia e Geologia (DSMP/DGEG), onde manifesta “de forma veemente” sua oposição à concessão de exploração de caulinos no Pocinho, afirmando que ela não é de interesse público. Para justificar, ele menciona o projeto agrícola integrado e agropecuário existente na zona do Pocinho, de que dependem cerca de 180 agregados familiares; e as experiências de expropriação e rebaixamento do nível freático, como aconteceu durante a construção da autoestrada A17 (VAZ, 2014a; SANTOS, 2014).

 

Numa tentativa de acalmar os moradores da Figueira da Foz, que temiam ter suas terras expropriadas para exploração mineral, um representante da empresa participou de sessões públicas de esclarecimento nas freguesias de Bom Sucesso e Ferreira-a-Nova, quando assegurou que a mineração não avançará contra a vontade dos proprietários dos terrenos, o que significa que, se não obtiver a licença, não recorrerá à expropriação (ALVES, 2014). No entanto, em Ferreira-a-Nova, os representantes da autarquia admitiram acionar uma providência cautelar para o caso de a licença de exploração ser aprovada e as populações se oporem (ALVES, 2014; OUTRA MARGEM, 2014).

 

Nos concelhos de Pombal, distrito de Leiria, e Soure, distrito de Coimbra, a empresa Corbário – Minerais Industriais SA requereu autorização para a exploração numa área de cerca de 440 hectares, junto à zona de Bonitos, onde há sete povoações situadas a distâncias que variam entre 40 e 300 metros dos limites das concessões pedidas. Além disso, 60% área requerida está na Reserva Ecológica Nacional (REN), e é uma das zonas de maiores recursos hídricos regionais, que abastece grande parte dos dois concelhos (CENTRO TV, 2014; FAZENDA, 2014).

 

Para evitar a aprovação do pedido de concessão, elementos da Comissão de Luta Contra a Exploração de Caulinos no concelho de Soure e da Associação de Defesa do Património daquela vila foram à Assembleia da República manifestar suas preocupações. Eles pleitearam também a alteração da lei atual que não estabelece distâncias adequadas de segurança entre as habitações e as explorações de caulino. Alegaram ainda a exploração sucessiva de áreas inferiores ao limite legal, de modo a evitar procedimentos de Avaliação de Impacto Ambiental (AIA) (CENTRO TV, 2014; CDU SOURE, 2014).

 

Os moradores foram recebidos pelos grupos parlamentares do Partido Socialista (PS), Partido Comunista Português (PCP) e pelo Bloco de Esquerda (BE), que asseguraram que iriam fazer uma interpelação direta ao Governo para indagar o porquê dos processos de exploração estarem a ser conduzidos contra os interesses das populações. De acordo com os deputados, os pedidos de concessão são efetuados diretamente à DGEG, sem consulta prévia aos municípios. Eles ficaram de acionar o Ministério do Ambiente no sentido de que estes processos não dispensem procedimentos de AIA (CENTRO TV, 2014; NOTÍCIAS DO CENTRO, 2014b).

 

O Partido Ecologista “Os Verdes” (PEV) também fez uma interpelação ao Governo sobre a exploração de caulinos em Pombal e Soure, exigindo saber se foi efetuado “algum estudo de impacto ambiental” que viabilize esta atividade nestes concelhos; “qual o impacto que poderá ter na saúde das populações que estão junto a esta área?”; “qual o impacto na rede hidrográfica e no abastecimento de água às populações?”; e “que estudos foram efetuados para se poder comparar quais os ganhos e as perdas entre a parte económica e o passivo ambiental”, bem como se o Governo tem “uma posição definitiva sobre este pedido de licenciamento” (NOTÍCIAS DO CENTRO, 2014a).

 

Por sua vez, o presidente da Câmara de Pombal procurou o secretário de Estado da Energia para apontar “algumas lacunas” na legislação que regula o exercício das atividades de prospecção, pesquisa e exploração dos recursos geológicos, designadamente os caulinos. Entre os aspectos citados está o fato de que a legislação “impede claramente a participação das autarquias locais no processo de decisão de atribuição de direitos de concessão de exploração de depósitos minerais, recurso geológico do domínio público do Estado Português”. Destacou ainda o fato de as câmaras municipais não terem competências legais para fiscalizar as áreas atribuídas para exploração de depósitos minerais, não sendo as autarquias “convocadas para ações de fiscalização, vistorias ou acompanhamento das áreas de exploração no terreno”, nem das intenções de recuperação paisagística e ambiental (NOTÍCIAS DO CENTRO, 2014c).

 

No concelho de Cantanhede, o DGEG publicou, em dezembro de 2013, avisos de requisição de exploração de caulino, envolvendo uma área de mais de 2.300 hectares, onde está situada a zona de proteção da nascente de Olhos de Fervença, que abastece uma população de mais de 60 mil habitantes (LUSA, 2014; AGÊNCIA LUSA, 2014b). Respondendo aos pleitos da população, os deputados do PS eleitos pelo círculo de Coimbra questionaram o ministro do Ambiente sobre a anunciada exploração de caulinos no concelho (LUSA, 2014; PORTAL DO CONCELHO DE CANTANHEDE, 2014).

 

Diante dessas várias requisições envolvendo diferentes concelhos, foi criada uma petição pública intitulada “Sem caulinos eu vivo, sem água não!”, dirigida à presidente da Assembleia da República, onde habitantes, naturais e/ou pessoas que trabalham ou visitam os concelhos de Cantanhede, Montemor-o Velho, Mira, Figueira da Foz e Coimbra solicitam a inviabilização da exploração de caulinos. Eles alegam que as consequências dessa exploração compromete “um outro recurso natural de capital importância, que é a água”; lembram que a atividade pode vir a contaminar o aquífero com metais pesados e outros poluentes, além de destruir lençóis freáticos numa vasta zona essencialmente agrícola e florestal, o que poderia deixar as terras de regadio estéreis (INDEPENDENTE DE CATANHEDE, 2014).

 

Com base na documentação disponibilizada e nas assembleias de esclarecimento, o Núcleo Regional de Coimbra da Quercus fez uma avaliação sobre os pedidos de concessão. Entre outros pontos, a entidade aponta que “as zonas em apreciação para a eventual exploração de caulinos por parte da indústria extrativa encontram-se maioritariamente integradas em espaços abrangidos pelas condicionantes Reserva Agrícola Nacional (RAN) e Reserva Ecológica Nacional (REN)”, que têm “um valor intrínseco que deve ser valorizado não podendo ser alienadas da função que lhes é reconhecida sem uma reflexão profunda sobre custos e benefícios”. Alertou também sobre a necessidade de se realizar uma Avaliação de Impacte Ambiental (AIA) sobre toda a extensão da concessão; que a empresa interessada registre promessa de cumprimento da recuperação paisagística com reposição dos inertes extraídos; e que se obtenha por parte da DGEG “uma garantia de que a eventual exploração de caulino que venha a ser autorizada não será, em caso algum, extensível a areias ou outros recursos” (QUERCUS, 2014).

 

Bibliografia

 

AGÊNCIA LUSA. PS questiona ministro do ambiente sobre exploração de caulinos em Cantanhede. Expresso, Opinião, 6 fev. 2014.

 

AGÊNCIA LUSA. PS questiona exige suspensão de processo de exploração de caulino em Cantanhede. RTP Notícias, 10 jan. 2014.

 

ALVES, JOT. Cada vez mais vezes se levantam contra exploração de caulino. Jornal As Beiras, 10 fev. 2014.

 

CDU SOURE. A comissão de luta contra os caulinos foi à Assembleia da República. Worldpress, 17 mar. 2014.

 

CENTRO TV. Os Verdes questionam exploração de caulinos em Soure e Pombal. Centro Tv, 18 abr. 2014.

 

DIÁRIO DE COIMBRA. Caulinos levam OS a convidar ministros para uma visita. Diário de Coimbra, 16 fev. 2014.

 

FAZENDA, Luís. Exploração de caulinos nos concelhos de Soure e Pombal. Grupo Parlamentar, Bloco de Esquerda, 18 mar. 2014.

 

INDEPENDENTE DE CANTANHEDE. Petição pública contra exploração de caulino já ultrapassou as 450 assinaturas. Diário Online, 28 jan. 2014.

 

NOTÍCIAS DO CENTRO. Socialistas de Pombal frontalmente contra a exploração de caulinos. Notícias do Centro, 20 fev. 2014a.

 

NOTÍCIAS DO CENTRO. Autarcas contra exploração de caulinos no concelho. Notícias do Centro, 25 fev. 2014b.

 

NOTÍCIAS DO CENTRO. Partido Os Verdes questiona exploração de caulinos em Soure e Pombal. Notícias do Centro, 18 abr. 2014c.

 

PORTAL DO CONCELHO DE CANTANHEDE. Água no concelho de Cantanhede – sim ou exploração de caulino não? Portal do Conselho de Cantanhede, 12 jan. 2014.

 

O PALHETAS NA FOZ. Todos contra a exploração de caulinos no Bom Sucesso e em Ferreira-a-Nova. Jornal Online, Figueira da Foz, Portugal, 21 fev. 2014.

 

OUTRA MARGEM. Não aos caulinos. Blog, fev. 2014.

 

SANTOS, Bruno E. Contra a exploração de caulino. Visões da Gândara, 05 fev. 2014.

 

QUERCUS. Concessão e exploração de caulinos no distrito de Coimbra. jun. 2014.

 

TRINDADE, Cláudia. Câmara da Figueira da Foz aprova proposta contra exploração de caulino. Diário As Beiras, 18 fev. 2014.

 

VAZ, João. Caulinos no concelho da Figueira da Foz – a posição da Câmara Municipal. Blog O Ambiente na Figueira da Foz, 15 fev. 2014.

 

30 de junho de 2016

Bibliography
Maps
Associations/Movements
Images
Institutions/Corporations

GENERAL INFORMATION

 

Period: 2014 -

Region: Centro

District: Coimbra / Leiria

Localization: Figueira da foz / Soure / Pombal / Cantanhede.

Intensity level: 4/5

GPS: 40.1558, -8.8569

 

ABSTRACT

The people and social and political organisations of Figueira da Foz united to try to stop the licensing of kaolin mining in the region. The region has vast forests and is close to waterways and lakes. Agricultural activities that sustain numerous families are also concentrated in the area.

Under construction

Several voices rise up against kaolin mining in Figueira da Foz, Cantanhede and Soure

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Portugal: Ambiente em Movimento

Um projeto de cooperação entre Oficina de Ecologia e Sociedade (CES/UC), CETEM (MCTIC/Brasil) e SOCIUS-CSG (UL)

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